DA LIBERDADE

Recordando
Thu, 14 Apr 2005 22:49:29 +0100





DA LIBERDADE

Gibran



Depois, um orador disse-lhe: Fala-nos da liberdade.
E ele respondeu:
Tenho dado convosco à porta da cidade e perto dos vossos átrios, prostrados a adorarem a vossa própria liberdade,
quais escravos que se humilham perante um tirano e o glorificam enquanto ele os massacra.
Sim, no bosque do templo e à sombra da cidadela tenho visto os mais livres de entre vós carregando a liberdade como um jugo e como se arrastassem grilhetas.
E o meu coração sangrou dentro de mim. Porque podereis ser livres quando o desejo de atingir a liberdade se tornar a vossa armadura e tiverdes cessado de falar de liberdade como um fim e uma realização.
Sereis verdadeiramente livres não quando os vossos dias forem passados sem ansiedade e as vossas noites sem necessidades e sem penas,
mas antes quando estas coisas cercarem a vossa vida e vos elevardes acima delas, despidos e libertos.

E como podereis alçar-vos para lá dos vossos dias e das vossas noites se não desfizerdes as cadeias com as quais, na aurora do vosso entendimento, tendes prendido a vossa hora do meio-dia?
Na verdade, aquilo a que chamais liberdade é a mais forte dessas cadeias, ainda que os seus elos brilhem ao sol e ofusquem os vossos olhos.

E para poderdes ser livres, que lançar fora se não os fragmentos de vós mesmos?
Se há uma lei injusta que quereis abolir, foi a vossa própria mão que a escreveu sobre a vossa fronte.
Não a podeis apagar queimando os livros de leis, nem lavando a fronte dos vossos juízes, ainda que sobre ela derrameis o mar.
E se há algum déspota que gostaríeis de destronar, vede primeiro se o seu trono erigido em vós foi também derrubado.
Porque, como poderá o tirano governar os homens livres e altivos se a tirania não estiver na sua própria liberdade, e a vergonha na sua altivez?

E se é a inquietação que quereis expulsar, ela não vos foi imposta: fostes vós que a escolhestes.

E se há um temor que quereis dissipar, é no vosso coração que ele se encontra e não na mão de quem vos aterroriza.
Na verdade, todas as coisas se movem constantemente no vosso ser num semiabraço: o desejado temido, o amado e o repugnante, o que procurais e o que repelis.
Em pares enlaçados, estas coisas movem-se em vós como se movem as luzes e as sombras.
E quando a sombra se desvanece e deixa de estar presente, a luz que esmorece torna-se sombra de uma outra luz.
Assim é a vossa liberdade que, libertando-se suas cadeias, se torna ela mesma a cadeia de uma liberdade maior.
















Abraços Solidários
Duarte Antunes