
[...]
Estares; ou seres;
a palavra ou a frase,
a dúvida ou o sentido,
para isso terias, no entanto, que reaprender tudo,
reaprender a chorar, a perceber,
reaprender a reaprender;
porque talvez, afinal, seja tudo simples,
o efeito suceda à causa e a vida
encare apenas a sua própria face
(embora verdadeiramente isso não tenha
[demasiada importância);
terias que saber (e não o saber)
que dias e esperança,
incredulidade e medo,
tempo e lugar, carne e espírito
são sombras que nenhum
corpo e nenhuma luz consomem;
reaprender a ironia;
por fim, como uma imagem desfocada
recentrando-se, estarias tão perto ou tão longe
que a tua existência coincidiria,
transparente e pura coincidência.
Manuel António Pina
in Atropelamento e Fuga
Edições ASA, Porto, 2001
http://www.aprendendoaviver.com.br
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